Tuesday 14 July 2009

Aproveite Seu Sintoma

“Ele explicou que feiticeiros são homens de conhecimento mais do que homens de razão. Desta forma, eles estão um passo a frente dos intelectuais ocidentais que assumem que essa realidade - que quase sempre é equiparada com verdade - é conhecida através da razão. Um feiticeiro clama que tudo o que é conhecido através da razão são os nossos processos de pensamento; mas que é somente entendendo nosso ser total, no seu mais sofisticado e intricado nível, que poderemos eventualmente apagar os limites com que a razão define a realidade.”

Being in Dreaming
By Florinda Donner

Apesar de ainda não ter lido, eu criei uma relação de amor com o título de um livro de Žižek: Enjoy Your Symptom. Desde que eu vi esse título pela primeira vez, ele me intrigou a ponto de se tornar um dos meu mantras pessoais.

Ele me remete diretamente ao dia em que descobri que eu era paranóica.

Foi numa aula de Psicologia Social. O professor falou que se você acreditasse em algum tipo de realidade alternativa, como em Matrix - exemplo dado por ele-, você era paranóico. Acho que devo ter comentado rindo com a pessoa do lado: “Então sou paranóica!”. Não que eu acredite que estamos em estado de animação suspensa em uma cápsula, sonhando dentro de um sistema de computador, enquanto máquinas espertas se alimentam de nossas energias - mas a verdade é que estamos. Acredito que essa foi uma das melhores maneiras já mostradas no cinema sobre a nossa condição de gado - vale colocar aqui que um dos capítulos do livro de Žižek trata do filme Matrix, e lendo rapidamente na livraria, vi que ele trata do fato de que, quando você sai da Matrix, você continua em uma vida de sofrimentos, lutas e privações, ou seja, esse primeiro despertar é ilusório. Não posso especular muito sobre o que ele diz realmente no livro pois foi uma leitura ultra superficial, mas se eu captei o sentido correto, me parece bastante acertado. Se você parar e pensar que estamos em um “estado de cebola”, camada sobre camada, o primeiro despertar é só isso mesmo: o primeiro de muitos outros que ainda vamos ter que buscar, com o risco de parar no meio achando que chegou no final.

Também me lembro de um outro dia, numa aula de Teoria da Psicanálise, quando uma colega comentou sobre uma experiência mística que ela teve em uma dessas jornadas esótericas. Ela perguntou ao professor se isso seria uma experiência espiritual ou apenas um epsódio psicótico, no que ele respondeu algo como: “E por que não os dois ao mesmo tempo?”.

A questão é que para ser bruxa, feiticeiro, mago, grão-mestre, e até padre, acreditar em níveis de realidade ou mundos além da nossa esfera cotidiana, alguém tem que ser meio, senão totalmente, doido, paranóico e psicótico, entre outas coisas. Claro que não dentro dos moldes da patologia tradicional, um louco descontrolado, ou doido de jogar pedra, como se diz na Bahia, mas um louco que sabe se passar por normal para os outros normalpatas. Que por falar nisso, a normalpatia é o que eu considero a pior loucura, aquela loucura legítima, em que o doido nem sabe que é doido.

Aqui entram, finalmente, conceitos que me são muito caros, e com os quais eu também tenho um caso de amor: a loucura controlada e a espreita como colocados por Castaneda em seus livros.

A loucura controlada tem sido o meu método, se é que isso é um método, de operar na realidade cotidiana sem enlouquecer nos moldes tradicionais e ir parar nas mãos de um psiquiatra com cara de peixe-morto (é que uma vez eu me auto-diagnostiquei depressão e fui consultar um psiquiatra que tinha cara de peixe-morto, e para o qual eu nunca voltei, porque para mim ele não passava de um zumbi, mais zumbi que eu, então como poderia ele me ajudar? Sim, sim, típico comportamento paranóico). E a espreita tem sido o meio almejado de conseguir me ajustar a tudo isso, fingindo sem ser falsa. Para mim, a loucura controlada depende diretamente da maestria na espreita.

Claro que eu não domino a espreita ainda e vivo me deixando enredar pelo cotidiano volta e meia, confundindo a máscara com a cara, e achando que eu sou o personagem. Resumindo, me identificando com a verdadeira loucura que é a dita realidade. Mas apesar de tudo isso, eu acho que vale a pena continuar, mesmo que isso esteja consumindo a minha vida inteira, afinal, com o que mais eu consumiria ela? O que vale mais?

Minha única conclusão aqui é : aproveite seu sintoma e não tenha pena de si mesmo.

Enjoy your symptom and don’t feel sorry for yourself

3 comments:

  1. status: curtindo minha paranoia

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  2. antecipadamente desculpa (não sei se a netiqueta permite), mas quem é você?!!?

    eu não sei por que, mas me amarro nessas "coisas".

    a fragmentação do ser humano e a sua busca por integralização.

    a unica coisa realmente real é a falta de dinheiro, o resto é interpretação. =o)

    a nossa "realidade" é patologica (serio), mas fico com roberto freire (anti-psiquiatria) já que a locura é em relação a algum padrão.

    quanto a experiência mistica e ditas disfunções mentais realmente correm em paralelo e acredito como leigo que realmente sejam confudidas.

    me diz, se jesus cristo aparecesse para você e te falasse um grande esclarecimento para humanidade, você seria louca de propagar? ;op

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  3. Jesus? Nao. Cristo? Sim.
    Quem sou eu?
    A resposta depende, porque nao tem uma unica resposta.
    Como dizem as pessoas possuidas por demonios: "Eu nao sou um, somos uma legiao."

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